Divulgado na tarde desta quinta-feira (22), o documento aponta que - até o ano passado - o país dispunha de informações necessárias para dimensionar o tamanho do estoque de apenas 52% das 135 espécies de interesse econômico analisadas durante a elaboração do relatório, incluindo informações relativas à mortalidade por pesca e biomassa.
"Dos 135 estoques pesqueiros marinhos estudados, só 70 possuem avaliação quantitativa, fruto de projetos de pesquisa concluídos em 2022", afirmam os responsáveis pelo documento, destacando que houve, em 2023, uma pequena melhora em comparação a 2022, quando foram constatados dados adequados sobre apenas 49% das espécies legalmente comercializadas no país.Os técnicos e colaboradores da Oceana reconhecem que, desde 2020, quando a organização passou a dedicar mais atenção ao tema para elaborar o 1º Relatório Auditoria da Pesca - divulgado em 2021 - houve uma gradativa melhora na administração das frotas e dos recursos pesqueiros, bem como maior transparência na divulgação dos dados existentes.
Ainda assim, para eles, a gestão pesqueira "continua mal administrada, com regramentos defasados, uma desconectada visão de longo prazo" e, ao contrário da agropecuária brasileira, é "incapaz de demonstrar sua importância econômica por meio de dados concretos, como volumes de produção, receitas e empregos gerados".
Das 70 espécies sobre as quais os responsáveis pelo relatório encontraram informações suficientes e adequadas, 46 (ou 66%) estão sobrepescadas, ou seja, dois a cada três destas espécies são capturadas em volumes superiores a suas respectivas capacidades naturais de reprodução, estando, portanto, em situação negativa.
O impacto negativo da atividade para a biodiversidade é potencializado pela chamada captura incidental (bycatch), ou seja, não intencional por afetar espécie sem valor comercial ou indivíduo que não corresponde às características desejadas. De 21.242 embarcações pesqueiras cujas inscrições foram analisadas, poucas adotam medidas capazes de reduzir o problema de forma significativa.
Assim como nas três edições anteriores, o Relatório Auditoria da Pesca aborda questões políticas e institucionais que dizem respeito à administração pesqueira, mas, pela primeira vez, a equipe responsável se propôs a analisar em detalhes o orçamento federal destinado ao segmento.
Além disso, segundo eles, dos R$ 188,7 milhões a que tinha direito no ano passado, o Ministério da Pesca e Aquicultura havia executado, até a conclusão do relatório, apenas 23% ou cerca de R$ 43,25 milhões - muito embora tenha empenhado, ou seja, assumido o compromisso de usar tais recursos para efetuar pagamentos futuros, mais de 99% de todo seu orçamento disponível. Para 2024, o orçamento do MPA foi ampliado para cerca de R$ 350 milhões, um cresci- mento de 85% em relação ao montante de 2023
Feito o diagnóstico, os técnicos e colaboradores da Oceana sugerem a atualização da chamada Lei da Pesca, (Lei nº 11.959), em vigor desde 2019.
"Uma adequada política de Estado para a pesca, amparada em um marco regulatório de melhor qualidade e espelhando uma visão de futuro – o que não é o caso do marco atual – seria indispensável para blindar as atividades finalísticas de gestão das turbulências provenientes das disputas políticas, da luta por poder, por cargos e orçamentos federais construídos às custas das contribuições da sociedade", apontam os responsáveis, defendendo a modernização da lei com participação social e fundamentos científicos.
Eles também recomendam a construção de um plano nacional para produção de estatísticas pesqueiras, com auxílio de instituições e especialistas; a retomada do monitoramento e da coleta de dados a bordo das embarcações pesqueiras; tornar regular os processos de avaliação dos estoques pesqueiros e relacionar esses dados a políticas efetivas de gestão como, por exemplo, os limites de captura e que se busquem alternativas para reduzir a instabilidade institucional crônica do setor, por meio da criação de uma autarquia.
A reportagem da Agência Brasil entrou em contato com o Ministério da Pesca e Aquicultura, mas até o momento da publicação desta matéria ainda não tinha recebido retorno.